Fios de Sangue

Uma escultura em arame com dobraduras.

Flutuam esses fios de sangue, ora em êxtase, ora em total descabelamento, pois o sangue dá aos corpos tudo, absolutamente todo o espectro da experiência humana, assim então os corpos contorcem-se e celebram-se como uma sinfônica sem fôlego, mas que nunca para: do caos ao éter e do etéreo de volta ao caos, do corpo ao espírito, do devaneio da alma à lama do chão — e tudo o que couber no meio: uma ópera (Carmem?) por Callas, ou um acidente de avião, ou tiros, ou um belo casamento, ou uma vida inteira embaixo de um vulcão — o sangue de cada fio sobe agudo ou desce grave, e floresce no início e no final.

E ASSIM, O SANGUE NUNCA MORRE.

Escultura-instalação em arame com dobraduras de papel / materiais usados: arame, acrílica, purpurina, papel, algodão, fita de viés, tecido / 250cm x 125cm x 100m / 2021

Essa obra foi produzida para a exposição Partitura Cromática (info abaixo) na qual os artistas se inspiravam numa música para criar uma obra. A minha música foi "Sonata p/ Violoncelo e Piano nº 1 em E-Menor, Op. 38" de Johannes Brahms à qual adicionei sinos tibetanos, os quais gosto muito; possuo um címbalo tibetano que herdei do meu mentor Ken.

Fios de Sangue
Fios de Sangue
Fios de Sangue
Fios de Sangue
Fios de Sangue

FICHA TÉCNICA


Artista: Ana Karina Luna
Ano: 2021
Técnica: Escultura-instalação com dobraduras
Materiais: Arame, tinta acrílica, purpurina, papel, algodão, fita de cetim
Dimensões: 2,50m x 1,25m x 1m
Música: Sonata p/ Violoncelo e Piano nº 1 em E-Menor, Op. 38 + sinos tibetanos
Autor da Música: Johannes Brahms

O SANGUE NUNCA MORRE


Assim que Alice Barros me fez a proposta eu já sabia — sabíamos — que seria uma escultura de arame. Fios de Sangue se configurou praticamente na hora, na minha imaginação: não seriam apenas fios de sofrimento — entortados, cheios de nós, como já fiz em outras esculturas — mas também fios de celebração, agradecimento pelo nunca cessar do sangue da vida, seja como seja. Trazendo glória ou tropeço ou lama ou amor, se há algo que nunca atrasa ou falta em vidas que estão corporificadas é o sangue. Dos ancestrais, dos que vieram antes, sangue de 300 anos atrás, sangue de dois mil anos antes.

O sangue do próprio Cristo, não como sangue dele que é de todo mundo — pois cada um tem sua própria paixão para viver —, mas como exemplo literal de que sangue é, de fato, Paixão. Não é assim que é chamada? A Paixão de Cristo. Onde um corpo mostra como vive o seu sofrimento e as suas convicções. Sofrimento e sangue e glória são únicos, personalizados, individuais. Não se pode viver ou aproveitar o do outro. TEM que se viver.

Esse é o requisito do sangue: viva-me, e se me viveres, dar-te-ei "lama e glória/na mesma prateleira/da geladeira", lê o menor poema do meu livro "Maluquete Quer Dançar". Jesus fez sua demonstração própria de como escolheu viver o seu sofrimento. Cada um tem o seu fio de sangue para vivenciar. É cada um que se salva. E por mais que se derrame este sangue, seja como seja, nunca falta. Sempre está, nunca morre antes da gente. Se há algo que não desiste de nós é o sangue; trespassa-nos, de fato. Vive além de mim, de tu, nos outros corpos descendentes que vêm depois.

Não, não é cada um que continua, é o sangue.

Mas e nós? O que fazemos aqui? Cada corpo marca um começo e um fim de alguma coisa. A individualidade de cada pessoa dá ao sangue curvas, danças, direções. Cada corpo é uma rosa que desabrocha duas vezes: em seu nascimento e em sua morte; rosas grandes, florações pequenas, não importa, nesses dois momentos, exalam a essência única do que existe de imutável em cada pessoa: como ela é. Como dobraduras de papel, que inicialmente parecem impossíveis de imitar algo real, cada corpo também consegue, a partir do simples puro sangue e suas pequenas células venosas, imitar algo muito real.

O mundo real não é aqui, mas este também é um mundo.

No mundo do sangue, este portal vermelho que é a vida, é o que cada corpo atravessa, migra entre os seus dois grandes triunfos: a hora de nascer e a hora de morrer. Sente, o tempo todo, o gosto, o toque, o pulsar, a pressão, a temperatura do sangue, da paixão que é estar vivo, que é experimentar o sangue de tempos atrás correndo, desta vez, em NÓS. Encontram todos esses corpos com outros: outros sangues, outras linhas de vida; engancham-se, prendem-se, movem-se juntos, bailam juntinhos. Balançam, mas, raramente, realmente caem. O sangue de antes segura cada corpo, pois intenciona ser passado ao futuro. De onde vem? Vem o sangue da luz?

E no fundo...

No fundo, o mistério, a Deusa Nyx, a que veio primeiro e pariu o universo; o buraco negro, o caos, a escuridão, o feminino. Tudo começa e acaba no negro. É o paridor cósmico. Contra esse fundo negro, cada corpo dança o seu baile trágico e precioso, de fio de sangue que começa e acaba em rosas brancas que nunca se maculam; dança cada corpo contra o escuro. O cosmos os assiste: corpos flanando como poeira cósmica que são, e nem a terra é terra, nem o chão é chão. Porque nada sólido realmente existe.

Flutuam esses fios de sangue, ora em êxtase, ora em total descabelamento, pois o sangue dá aos corpos tudo, absolutamente todo o espectro da experiência humana, assim então os corpos contorcem-se e celebram-se como uma sinfônica sem fôlego, mas que nunca para: do caos ao éter e do etéreo de volta ao caos, do corpo ao espírito, do devaneio da alma à lama do chão — e tudo o que couber no meio, uma ópera (Carmem?) por Callas, ou um acidente de avião, ou tiros, ou um belo casamento, ou uma vida inteira embaixo de um vulcão — o sangue de cada fio sobe agudo ou desce grave, e floresce no início e no final.
Esta obra é parte da Exposição Digital

PARTITURA CROMÁTICA

22 artistas, 30 obras, 22 músicas

EM CARTAZ:
19/ABR 2021 a 2/JUN 2021

CURADORIA:
Alice Barros e Robertson Dorta

EXPOGRAFIA e MONTAGEM:
Alice Barros, Daniel Cavalcante, Jennyh Gama, Robertson Dorta e Weber Bagetti

ARTISTAS:
Ana Karina Luna, Ana Luiza Bargham, Cida Vieira, Daniel Cavalcante, Fátima Vieira, Flaviane Prado, Gabi Coêlho, Jackson Lima, Jennyh Gama, Kayo Queiroz, Layla Vilela, Lourani Correia, Lucilda Galvão, Magdália, Maria Albuquerque, Milla Pasan, Noeme Gomes, Raissa Galvão, Rhuana Caldas, Synara Holanda, Tati Barros e Weber Bagetti.

A exposição física foi exibida no Complexo Cultural Teatro Deodoro, em Maceió, AL

Tour Virtual da Exposição →

POEMA RELACIONADO

O poema que veio junto com a obra, como é comum do meu processo criativo:

Somos fios de sangue
nascemos rosa branca
morremos rosa branca
Viemos do fundo.

Somos fios de rosa
nascemos fundo
morrendo fundo
Viemos vermelho.

Somos fundo
nascemos vermelho
morremos vermelho
Viemos do branco.